Do lado de cá fica a luz, o lar, a realidade. Lá o escuro, o mistério, a embriaguez. Por este caminho Jeff Buckley passou de maneira encantadora, de gole em gole de vinho lilás, até se afogar no escuro. Agora outro trovador americano, Ryan Adams, faz o mesmo caminho na direção contrária. "Follow the lights that drive you home", canta Ryan na primeira faixa do seu mais recente EP.
Se Ryan fosse um cineasta, Follow the Lights seria um curta-metragem filmado logo após um longa importante. No meio do ano, o cantor lançou Easy Tiger, disco bem-sucedido e apontado como uma retomada de prumo em sua conturbada carreira. O EP, lançado quatro meses depois, tem duas músicas inéditas e cinco regravações. Mais do que um enredo espetacular, o mais importante nesta pequena obra é a fotografia.
Colocar uma canção assustadoramente linda como “Follow the Ligths” há três faixas de distância de uma lindamente assustadora versão de “Down in a Hole”, o hino depressivo do Alice in Chains, formou uma imagem e tanto. O abismo emocional que se revela é terrível, mas uma música que está no meio do caminho, “My love for you is real”, indica que Ryan Adams está escalando ao invés de desabar.
A impressão coincide com as notícias sobre a vida pessoal do músico, que se diz livre da vida de bebedeiras e drogas. A pressão externa e interna sobre sua criação artística, principal motivo de transtorno para Ryan, agora está sendo melhor dividida com a banda de apoio The Cardinals. Na conta conjunta pode ser depositado também o mérito pela sonoridade acústica esfaqueada por guitarras deste EP.
O (re)arranjo de “This is it”, do disco Rock N Roll (2003), deu à música um sentido maior do que uma paródia dos Strokes. Dizer “This is it, this is really happening” é o primeiro passo para ter onde se agarrar e não cair no maravilhoso abismo que o próprio cantor fotografou. No fim das contas, seguir a luz ou caminhar no escuro não são caminhos tão opostos assim (note que os símbolos de morte e vida se confundem). Jeff e Ryan parecem distantes, mas andando para cá ou para lá, ambos estão atrás de redenção.
Esta resenha foi publicada também no Pílula Pop. Passa lá.
